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Como a história do banco dos pobres pode contribuir para a paz

Delfim Machado  |  2023-05-12


A ideia de criar um banco dos pobres, há quase 50 anos, espalhou-se pelo Mundo e tornou-se prémio Nobel da Paz em 2006. Esta sexta-feira, no Fórum da Sustentabilidade e Sociedade, em Matosinhos, o fundador do banco ​​​​​​​Grameen, Muhammad Yunus, pediu às gerações mais jovens para usarem o seu exemplo para construir a paz.

Foi um discurso carregado de humanismo, quase uma ode à paz, aquele que Muhammad Yunus proferiu esta sexta-feira em Matosinhos, com uma crítica feroz às empresas e aos bancos que só agem movidos pelo lucro.

A história de como este professor de uma pequena universidade do Bangladesh se tornou prémio Nobel da Paz em 2006 remonta há quase 50 anos, mais concretamente a 1976, quando decidiu criar o banco Grameen. Esta instituição especializada em microcrédito tornou-se conhecida como o banco dos pobres porque emprestava pequenas quantias nas aldeias sem que, para isso, exigisse garantias ou advogados. Surpresa: tem hoje mais de duas mil agências a funcionar com este método e uma incrível taxa de reembolsos de quase 99%, de fazer inveja aos principais bancos do Mundo.

Como é que isto aconteceu e de que forma pode servir de exemplo para a paz? "No fundo, o crédito significa confiança, mas os bancos pegaram no crédito e criaram um negócio em torno da desconfiança", explicou Yunus. E os bancos decidiram "emprestar dinheiro às pessoas que já têm dinheiro, em vez de emprestarem aos pobres". Só que a pobreza, acrescentou, "não é criada pelos pobres, não é culpa dos pobres, é culpa do sistema que criámos e que está concebido de tal forma que leva todos os recursos de baixo para cima e o topo torna-se cada vez mais pesado, mas nas mãos de poucas pessoas".

O fundador do Grameen defende que a natureza do ser humano "é ser empreendedor", por oposição a "este modelo em que os seres humanos transformaram-se em robôs de fazer dinheiro". Daí que defenda um conceito de negócio social em que o banco que empresta não está interessado nos lucros da empresa: "Apenas têm de devolver aquilo que investimos, que emprestamos, e temos milhares de jovens a criar o seu próprio emprego em vez de estarem à espera, sentados, de ter um emprego".

Assim, Yunus adverte que todo o percurso de vida deve ser "para libertar essa criatividade e esse potencial", ao invés de procurar alguém que nos dê ordens: "Assim que têm um emprego, a única coisa que interessa são as ordens do patrão, perdem essa liberdade". No fundo, trata-se de criar uma civilização diferente da atual que, segundo Yunus, se está "a aproximar perigosamente do precipício e do suicídio".

Por isso, as gerações mais jovens "têm que assumir o controlo" e caminhar para a paz, usando os "superpoderes" que as novas tecnologias lhes concedem. Isto porque os adultos, considera Yunus, não o estão a fazer. E, para o provar, interroga: "Temos ministérios da Defesa em todo o Mundo, mas alguma vez tivemos um Ministério da Paz? Temos um grande orçamento para Defesa, mas há orçamento para a paz? Temos indústria de armas, mas temos indústria da paz?". Ou seja, "falamos da paz, mas investimos dinheiro é na defesa e nas guerras", concluiu.


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