Grande Cimeira

"Nós pertencemos a algo porque partilhamos uma cultura"

Patrícia Naves  |  2023-02-07


O conhecimento da nossa identidade cultural é essencial para sentirmos que pertencemos a algo; e, a partir daí, para termos abertura para outras culturas, outros diálogos e sermos peças de uma comunidade mais sustentável. A crença é do ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, que, a propósito dos "Diálogos de Sustentabilidade", fala-nos também sobre a importância do investimento na preservação do património cultural e natural, como elementos cruciais da memória coletiva.

Nos "Diálogos de Sustentabilidade" vai falar-se agora de diálogos interculturais como uma forma de garantir cidades e comunidades mais sustentáveis. Como pensa que a cultura e os diálogos interculturais podem contribuir para essas comunidades?

A cultura é, nas suas várias funções, um mecanismo muito poderoso para a formação de comunidades de pertença. Nós pertencemos a algo porque partilhamos uma cultura. Ao mesmo tempo, o conhecimento daquilo que somos, das nossas identidades, também de forma dinâmica, é um mecanismo poderoso para conhecermos o outro e para termos disponibilidade de dialogar com os outros. Não há identidade e não há comunidade sem cultura e não há possibilidade de diálogo e de partilha também sem cultura.

No livro branco sobre o diálogo intercultural do Conselho da Europa, diz-se que a liberdade de expressão, assim como a vontade e a capacidade de ouvir o que os outros têm a dizer, são indispensáveis neste diálogo intercultural. Como se consegue manter esta abertura e tolerância e lutar contra a desinformação numa altura de redes sociais, de fake news?

De novo, o conhecimento é a melhor forma que nós temos de ter disponibilidade para os outros. O tema das fake news não é um tema que surgiu nas nossas sociedades hoje; tem contornos distintos agora, mas acompanha-nos há séculos. Há, aliás, uma declaração muito conhecida, do presidente Thomas Jefferson, que diz: "se me perguntarem se eu prefiro ter um Governo sem Imprensa ou Imprensa sem Governo, eu escolho a segunda, prefiro ter Imprensa sem Governo". Mas muitas vezes é esquecido o que ele diz imediatamente a seguir: que, tão importante como termos uma Imprensa livre para termos sociedades plurais, liberais - na altura, falávamos apenas e só da Comunicação Social no sentido mais lato -, é que todos tenhamos condições para ler e conhecer aquilo que é escrito. Então eu diria que a chave está de novo na informação partilhada, no conhecimento partilhado, mas também nas condições efetivas para que todos tenham acesso a esse conhecimento.

No tema dos objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS) da ONU, um dos ODS é, até 2030, fortalecer esforços para proteger e salvaguardar o património cultural e natural. Como contribui o património para o desenvolvimento sustentável, a interculturalidade; e como pode o Governo participar nesse esforço?

O património é exatamente aquilo que não é efémero e que garante a nossa identidade. Nós todos vamos passar, mas há uma permanência e uma continuidade, um conjunto de elementos, que são a nossa memória coletiva e que existem além do período em que nós vivemos. Portanto, preservar o património é garantir a memória. E a memória não é apenas um olhar nostálgico sobre aquilo que fomos, é uma forma de nos projetarmos, de olharmos para o futuro. E é por isso que nós precisamos, por um lado, da preservação do património - e isso, aliás, eu tenho dito várias vezes, e a prioridade política em 2023 no Ministério da Cultura é olhar de forma diferente com o investimento político, desde logo, e numa atenção particular àquilo que é o nosso património, os museus, os monumentos nacionais... Mas o património não é apenas um olhar de memória, é a forma como nós dinamicamente olhamos para a sociedade que somos hoje e procuramos projetar o futuro.

Reforçando a questão dos investimentos, tem referido esta aposta nos museus; mas como se vai concretizar?

Logo do lado do investimento e da dimensão orçamental, o orçamento do Ministério da Cultura tem vindo a crescer sistematicamente e só para o ano 2023, por relação com 2022, cresce 23%, e uma parte desse investimento é precisamente com a recuperação do património. Mas também com o investimento em aquisições para as coleções nacionais. Nós voltámos a ter uma política [neste campo] e agora, consolidada a institucionalidade de aquisições para as coleções dos museus nacionais, coisa que já fizemos no final de 2022, vamos ter dois milhões de euros para aquisições em 2023, e isso corresponde a esse objetivo. Mas também do ponto de vista da atenção política. Nós estamos a trabalhar numa transformação daquilo que é hoje a Direção-Geral do Património Cultural, precisamente para garantir essa atenção, essa prioridade, aos museus nacionais.

Debate, quinta-feira, no Teatro da Trindade

Na quinta-feira, dia 9 de fevereiro, decorre o quinto de seis "Diálogos de Sustentabilidade", uma parceria entre o Global Media Group e a Fundação INATEL. Dedicado ao tema "Comunidades Sustentáveis", contará com a presença do ministro da Cultura, Pedro Adão e Silva, e Mário Lúcio, compositor, escritor e antigo ministro da Cultura de Cabo Verde. Pode assistir em direto, a partir das 16 horas, nos sites do JN, DN, Dinheiro Vivo e TSF; ou ao vivo, no Teatro da Trindade, em Lisboa (inscrição obrigatória através de jn.pt ou dn.pt).


Outras notícias