Grande Cimeira

O que está a mudar na energia da UE

Kadri Simson  |  2023-05-08


Passaram-se quase 15 meses desde a invasão russa da Ucrânia. A UE mantém-se firmemente ao lado dos ucranianos e o único resultado possível é a vitória da Ucrânia. Mas há um efeito colateral desta guerra que por vezes é negligenciado: a forma como essa invasão e a resultante crise de energia está a transformar o sistema de energia da Europa. Quando começamos a ver os números finais da nossa produção e consumo de energia em 2022, é um bom momento para fazer um balanço das mudanças pelas quais passámos no ano passado.

Quando a crise energética atingiu a Europa, a prioridade imediata foi garantir o nosso abastecimento de energia e proteger os europeus, sempre que possível, do impacto dos preços altos. Reduzir a nossa dependência das importações de combustíveis fósseis russos também assumiu uma nova urgência - especialmente à luz do facto de o Kremlin ter usado as suas exportações de gás como uma arma.

A Comissão respondeu rapidamente com uma série de medidas de emergência de curto prazo - muitas das quais foram aprovadas em tempo recorde. Estas medidas incluíram novas obrigações de reabastecimento dos armazéns de gás antes do inverno, medidas coordenadas para reduzir o consumo de gás, a redução do consumo de eletricidade nas horas de pico e a introdução de um mecanismo de correção do mercado para garantir que os custos das importações de energia da UE não fossem desproporcionadamente mais altos do que noutros lugares do Mundo.

Em resposta à necessidade de nos desabituarmos das importações da Rússia, a Comissão apresentou um plano de médio prazo denominado REPowerEU. Publicado a 18 de maio, há quase um ano, este plano assentou em três pilares - acelerar o papel das renováveis, aumentar o investimento em eficiência energética e diversificar os nossos abastecimentos.

Chegámos a acordo sobre novas metas. Para as renováveis, a nova meta vinculativa será de 42,5% até 2030. Em 2020, esta meta era de 20%. Para a eficiência energética, a nova meta será reduzir o consumo para 11,6% abaixo do projetado até 2030, em vez da proposta de redução de 9% apresentada há dois anos.

Embora essas metas sejam vitais para orientar o investimento, as novas regras vão muito além disso, tentando identificar e reduzir os estrangulamentos. Por exemplo, nas energias renováveis, acelerar o processo de licenciamento tem o potencial para fazer a diferença - desde que as proteções sejam mantidas em áreas onde existem preocupações ambientais genuínas.

O terceiro elemento do REPowerEU é a diversificação dos nossos abastecimentos - mas de uma forma que não bloqueie a importação de combustíveis fósseis. Em 2022, vimos uma clara mudança nas importações de gás, afastando-se das entregas através de gasodutos e em direção ao gás natural liquefeito (GNL). Vários estados-membros investiram em unidades flutuantes de regaseificação nos seus portos. Também vimos alguns projetos de infraestrutura, planeados há muito tempo, entrarem em operação.

Os números provisórios mostram como conseguimos diminuir as importações mensais de gás na UE a partir dos gasodutos russos, de 42% em 2021, para menos de 10% agora. De acordo com dados iniciais, a UE estima que os pagamentos mensais totais à Rússia se reduziram em 87%, quando comparamos com o início da guerra - de 21,4 mil milhões de euros em março de 2022, para 2,7 mil milhões de euros em março de 2023. A Noruega já ultrapassou a Rússia como principal fornecedor de gás da União, e a Argélia não fica muito atrás.

Na mesma etapa, vimos como a nossa ação coordenada para reduzir a procura de gás também valeu a pena. A procura de gás caiu cerca de 18% entre agosto de 2022 e março de 2023, o que nos ajudou a economizar 52 bcm de gás. Portugal conseguiu uma redução de 16% neste período. 2022 também foi um ano recorde para o mercado europeu de energia solar fotovoltaica, com um crescimento anual de 47% em toda a Europa - um aumento de 27 GW em 2021 para mais de 41 GW em 2022. Também para a energia eólica houve um aumento de 34% nas instalações, atingindo cerca de 15 GW de nova capacidade de produção.

Portugal é um dos países da UE com maior quota de energias renováveis no seu consumo final de energia e é, por isso, um bom exemplo para outros países na implementação de soluções de energia renovável. Mas dada a quantidade de sol e vento em Portugal, ainda existe um enorme potencial de expansão e investimento. Precisamos de aumentar as interligações elétricas entre a Península Ibérica e o resto da UE.

Podemos ver claramente que os enormes desafios que o setor de energia da UE enfrentou no ano passado desencadearam mudanças sem precedentes na nossa transição para longe dos combustíveis fósseis. Sempre defendemos a importância das energias renováveis para a sua sustentabilidade. Os eventos do ano passado mostraram que as energias renováveis também são a forma mais barata de produção de energia e, se produzidas na Europa, podem desempenhar um papel importante na garantia da nossa independência das importações de energia - além de nos ajudar a manter o foco nos objetivos do Pacto Ecológico Europeu.

*Comissária Europeia da Energia


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